Sabe o que a deusa indiana da sabedoria e das artes tem a ver com o caos? Conhece a história de como ela criou o primeiro instrumento musical? Quer saber como a história de Sarasvati pode ajudar você?
Hoje vou contar algumas histórias dessa deusa impressionante, e dizer que mensagens ela traz para a sua vida.(Este texto surgiu do projeto Oráculo da Semana, em que conto histórias de várias deusas, sempre com uma reflexão e conselho para o dia-a-dia.)
Sarasvati ou Saraswati é uma das principais deidades do hinduísmo. Ela é a deusa associada às artes, à literatura, à sabedoria, à música, à dança, e a tudo que traz alma, beleza, vida, propósito e conexão. A palavra Sarasvati tem a ver com fluidez, e isso se reflete no rio que leva seu nome e nas áreas que ela representa. A arte, por exemplo, é uma expressão das nossas águas internas, das nossas emoções e é algo que flui como um rio de dentro de nós para outras pessoas.
Consorte de Brahma, o criador do mundo, ela faz parte da Tridevi, a tríade das principais deusas hindus, formada por Sarasvati, Lakshmi e Parvati. Costuma ser representada com quatro braços, simbolizando o intelecto, a mente, o ego e outras facetas. É frequentemente retratada acompanhada por um cisne branco e, às vezes, por um pavão. É muito reverenciada por artistas e estudantes, como a patrona das artes, dos estudos, da clareza mental e da sabedoria.
Sarasvati também é uma deusa ligada à revelação de respostas e do propósito de tudo que existe. É ela que organiza o mundo e dá “alma” às coisas. Ela ainda nos mostra como a beleza pode ser uma forma de organizar o caos.
Sarasvati, o sitar e o caos
Uma das histórias mais fascinantes sobre Sarasvati tem a ver com a criação do primeiro instrumento musical. O mundo estava cheio de caos, com sons e vibrações que não faziam sentido. Tudo era muito complicado e desordenado. Brahma pediu, então, a Sarasvati que ajudasse a criar harmonia e ordem naquele caos.
A deusa se retirou para um lugar isolado e entrou em uma meditação profunda. Enquanto meditava, teve uma visão. Viu um cisne branco e escutou um som, uma melodia que não podia ser vista.
Ao escutar essa melodia, Sarasvati pegou uma madeira sagrada do bosque e as cordas mais especiais do céu para montar o sitar, também conhecido como vina, um instrumento musical de cordas indiano com um som muito peculiar. Se você já escutou mantras ou músicas indianas provavelmente já ouviu o som do sitar.
Começou a tocar o instrumento e, através da vibração das notas, a deusa conseguiu organizar aquele caos de sons, trazendo paz, clareza, ordem e beleza. Foi assim que Sarasvati criou o primeiro instrumento musical, expressando seu dom de transformar caos em harmonia através da arte e da beleza. Por isso até hoje ela é frequentemente representada tocando o sitar.
A sabedoria diante do caos
A sabedoria que Sarasvati nos traz é, muitas vezes, fruto de uma revelação que surge diante do caos, através da conexão interior, da intuição e da criatividade. Quando temos um insight, por exemplo, é como se as peças de um quebra-cabeça caótico se encaixassem de repente, revelando algo novo, mas que já estava ali para ser descoberto.
Muitas mitologias falam da criação do mundo a partir do caos, e Sarasvati exemplifica como a organização e a beleza podem emergir dessa desordem primordial, desde que entremos em um estado de meditação, presença criativa e abertura, dando o tempo necessário para que o caos revele a ordem harmônica da sua essência.
Quando tentamos controlar os acontecimentos ou mesmo nosso caos interno, quando tentamos encontrar respostas apenas pela razão ou por orientações externas, não temos sucesso. Acabamos mais ansiosas, controladoras e desconectadas. Para que as respostas mais assertivas surjam, é necessário nos voltarmos para dentro, encontrarmos um espaço interno de serenidade e presença, dar tempo para que o que está confuso possa assentar, revelar a imagem que não estávamos conseguindo enxergar e trazer clareza.
Sarasvati nos convida a meditar e a buscar a sabedoria interna, a sabedoria e clareza que surgem da conexão e da criatividade, e não de uma briga egoica com o que está nos incomodando. Ela se retira para o silêncio durante o tempo necessário e se conecta com sua intuição, encontrando clareza e uma solução criativa. A arte e a sabedoria de Sarasvati vêm do silêncio, da introspecção, da fluidez da alma para o mundo, e não da imposição externa, da pressa ou da lógica pura.
Como isso ajuda na vida prática?
Sarasvati nos ensina que, se estamos passando por uma fase caótica ou precisamos tomar decisões importantes, devemos nos conectar com nossa sabedoria interna, permitindo que a clareza surja naturalmente. Ela nos lembra de que a clareza se manifesta quando damos espaço para que as emoções se acalmem e a poeira assente, deixando que a verdade se revele. O desespero só aumenta o caos nesses momentos.
Pense no que Sarasvati fez quando Brahma pediu que ela ordenasse o caos. Ela foi meditar, retirou-se, buscou o silêncio, fechou os olhos para o que estava fora. Foi assim que ela entrou em contato com a sua intuição, com a sua sabedoria interna, com o seu poder criativo artístico. E assim a deusa encontrou uma solução: criou o sitar e organizou o caos através da música.
Em vez de usar a lógica ou se desesperar e tentar resolver tudo às pressas, ela esperou para perceber qual era a música que surgia do caos, o que o caos tinha a revelar. A clareza e a ordem que Sarasvati nos traz são frutos da revelação e da intuição, que fluem como um rio quando conseguimos acessar a fonte da sabedoria. Quando estamos nos sentindo perdidas, é importante buscar nosso centro para podermos encontrar a saída.
Se estiver enfrentando uma situação turbulenta, tente fazer o que Sarasvati fez: medite, acalme-se, retire-se um pouco e não tome uma decisão imediatamente. Espere para ver o que emerge. O ideal é buscar a segurança e a certeza antes de tomarmos uma decisão e essa segurança vem de dentro para fora.
Por vezes, quando nos sentimos pressionadas a tomar uma decisão ou encontrar uma solução para um problema, podemos entrar em ansiedade e desespero. Tentamos buscar respostas através da lógica, de conselhos externos e, geralmente, isso nos deixa ainda mais perdidas e inseguras.
A clareza é algo que brota naturalmente, nunca é forçada. Não se ganha lucidez pensando incessantemente. A verdadeira clareza vem de um outro lugar. Ela surge do contato com a sabedoria interna, de libertar o olhar para enxergar diferente, ter um insight.
Se você estiver numa fase muito caótica ou indecisa sobre qual caminho seguir, em vez de forçar uma decisão, tente, na medida do possível, dar espaço para que essa clareza surja. Vá caminhar, dormir, meditar, criar, cozinhar. Faça algo que distraia um pouco a mente, para que as respostas possam surgir. Desconecte-se um pouco para permitir que a resposta venha de outro lugar.
Mesmo em momentos em que é necessário tomarmos decisões mais rápidas, quase sempre é possível parar ao menos dois minutos, se isolar, mesmo que seja no banheiro, respirar fundo e se conectar. Só esse pequeno movimento pode ajudar a termos mais clareza na hora de agir.
Pare de insistir e abra espaço
Se você está tentando encaixar uma peça e não consegue e já tentou de várias maneiras, pare de insistir. Daqui a pouco, a peça pode quebrar ou você pode ficar exausta e desistir. O que você pode fazer é tentar algo novo. Usar um óleo, pegar outra ferramenta, pedir para alguém virar a peça de um jeito diferente. Isso é criatividade. A criatividade está nas coisas mínimas e precisa de espaço para vir à tona. Este lugar de onde vêm as novas respostas é o espaço da criatividade. Se você não encontra respostas, é porque o que você conhece e sabe fazer não está funcionando. Você precisa de uma ideia nova. A novidade é criativa e precisa de pausa e de silêncio mental para brotar.
Sarasvati traz essa sabedoria, que vem de parar de insistir com a cabeça e se conectar, de esperar a clareza surgir. E não é uma espera passiva. Ela meditou com essa intenção e criou um instrumento a partir do que viu. Mas é preciso abrir espaço, sair um pouco do caos da mente, para que a clareza floresça. No fundo, sempre sabemos o que fazer. Acessar a sabedoria interna é estar em comunhão com Sarasvati.
Como levar essa sabedoria para nossas relações?
Também nas nossas relações, quando as emoções estão turbulentas, Sarasvati nos lembra de parar, respirar, tentar sair da discussão, dar tempo para que as emoções se regulem, para que possamos sentir o que realmente queremos dizer, quais nossas necessidades e limites, para, aí sim, comunicá-los de forma assertiva ao outro.
Sabe aquela mensagem que acabamos respondendo no impulso, sem termos clareza ou tomados por emoções à flor da pele e que acabam gerando ainda mais caos e mal entendidos? Esperar uns minutos antes de enviar, ir respirar, tomar um copo de água, meditar um pouquinho antes de rever a mensagem e enviar é uma atitude sábia que pode ajudar muito nos nossos relacionamentos.
Como a arte pode te ajudar
Não por acaso a deusa da sabedoria Sarasvati é também patrona da literatura, da música e da dança, que são outras formas de entrar em contato com a sabedoria e de organizar o caos de sons, palavras, pausas e movimentos soltos, através da criatividade. A arte nos ajuda a acessar uma sabedoria que vai além do racional.
Se você está com dificuldade de tomar uma decisão, de criar ou de sair de uma determinada situação ou emoção, a arte pode ajudar. Não precisa ser um artista. A arteterapia está aí para provar isso. Você não precisa criar uma obra-prima, mas pode expressar o que sente de alguma forma: através de movimento, pintura, texto, canto, culinária... Expresse, coloque para fora. Às vezes, a clareza vem logo depois.
Mesmo ler um poema, escutar uma música, assistir a um filme pode ajudar. Quando entramos em contato com a arte, seja produzindo ou interagindo com as que já existem, estamos acessando uma parte nossa para além da lógica. E isso nos ajuda a entrar em contato com esse espaço de sabedoria criativa de Sarasvati.
Quando estiver confusa diante de uma situação ou com uma emoção presa, mova-se, dance, ouça música, faça outra coisa. Escreva. Sinta qual o movimento que seu corpo pede, qual a cor, qual o traço, qual a frase e expresse. Isso ajuda a recuperarmos nossa fluidez, a libertarmos emoções presas no corpo ou inconscientes e a descobrirmos novas respostas.
Sarasvati, a essência e o propósito
Em outra história, Brahma instiga Sarasvati a entrar com ele em uma disputa sobre quem tinha a supremacia. Brahma começou a criar muitos seres, mostrando todo seu poder, mas percebia que suas criações careciam de algo essencial. Foi então que Sarasvati trouxe a essência, a beleza, a arte e o propósito de cada criação. Ela mostrou como essas características eram fundamentais para todos os seres criados.
Ao trazer essência às criações de Brahma, ela também ensina que devemos encontrar propósito e alma em nossas ações. Mesmo nas tarefas mais rotineiras, podemos trazer, presença, criatividade e significado. Sarasvati nos incentiva a não apenas produzir, mas a conectar-nos com nossas criações e a expressarmos nossa criatividade em todos os aspectos de nossas vidas.
Você vive no “piloto automático”? Quando não estamos presentes, quando fazemos tudo mecanicamente, o tempo parece passar sem nem notarmos e a vida vai ficando sem sentido, sem colorido, sem arte. Sarasvati nos lembra que somos seres criativos e precisamos exercitar nossa criatividade no dia-a-dia.
Pode ser em atividades simples. Mesmo nas tarefas mais metódicas, é possível sempre criar alguma coisa, dar seu toque pessoal. Preparar a comida de outra forma, mudar o penteado, fazer outro caminho. Você também pode ter um hobby criativo, um momento na sua semana dedicado a isso, em vez de ficar apenas consumindo conteúdo nas redes sociais.
É fundamental para nossa saúde mental achar espaços ou momentos para expressarmos nossa criatividade e nossa conexão com a expressão criativa. São elas que vão nos ajudar em outros momentos, quando estivermos nos sentindo sem saída, em meio ao caos, tensos e ansiosos por não saber o que fazer. Exercitar esse lado nos ajuda a relaxar e a resolver problemas de forma mais tranquila. Além, é claro, de deixar a vida mais colorida e fluida.
Sarasvati nos convida a encontrar e nutrir nossa alma através da arte, para que nos lembremos sempre de quem somos e sintamos propósito na nossa existência.
Quer saber o que outras deusas têm para te contar?
No meu grupo "Oráculo da Semana", todo domingo sorteio três cartas de deusas de diferentes culturas e, na segunda, envio imagens e vídeos com a história e mensagem de cada uma. Se você se sente inspirado pela mensagem de Sarasvati e quer continuar explorando essas ideias, junte-se ao nosso grupo de WhatsApp "Oráculo da Semana". E confira a playlist "Quem é a Deusa" no meu canal do YouTube, onde aprofundamos ainda mais nas histórias e ensinamentos de deusas incríveis de várias partes do mundo.
Com amor,
Flávia Esper
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